6 de Fevereiro, 2013

Notas para a AUDIÊNCIA PARLAMENTAR sobre Imposto sobre Transacções Financeiras.

I. Introdução

O Conselho da União Europeia adoptou uma Decisão autorizando 11 Estados-membros a introduzir um imposto sobre transacções financeiras, através do processo de “cooperação reforçada”.

A Comissão elaborará uma Proposta definindo a substância da cooperação reforçada.

Os objectivos visados com a criação de um sistema comum de ITF têm como base a proposta de Comissão de Setembro de 2011:

  • assegurar que as instituições financeiras contribuam de maneira justa e substancial para cobrir os custos da recente crise e estabelecer uma equidade do ponto de vista fiscal com os outros sectores;
  • criar medidas apropriadas para desencorajar transacções que não melhorem eficiências dos mercados financeiros, complementando, assim, medidas reguladoras, cujo objectivo é impedir crises futuras;
  • harmonizar a legislação relativa a fiscalidade indirecta sobre transacções financeiras e evitar a distorção da concorrência entre os instrumentos financeiros, os operadores e os mercados em toda a União Europeia.

A Federação Bancária Europeia, endereçou, em Março de 2012, uma carta à Ministra dos Assuntos Económicos e do Interior da Dinamarca, que então presidia ao Ecofin, em que anexava uma análise à Proposta da Comissão para criação do ITF.

A conclusão desta análise é que a Directiva sobre ITF, como então concebida, não alcançaria nenhum dos objectivos estabelecidos, tanto na Proposta, como na avaliação de impacto que a acompanhava.

Mas, pior, traduzir-se-ia em significativos impactos negativos na actividade do sector financeiro, afectando, por sua vez, a Economia Europeia em geral.

A Federação Bancária Europeia considerava que não tinha sido produzida qualquer prova de que certas actividades financeiras eram prejudiciais ou supérfluas. A avaliação de impacto da Comissão, não apresentava qualquer explicação razoável sobre a eficácia de um ITF no controlo do comportamento dos mercados. Adicionalmente, o impacto económico antecipado do ITF proposto não parecia ter sido devidamente tomado em consideração.

Tendo em conta as significativas consequências que um ITF aplicado na EU pode ter para a economia Europeia, a Federação Bancária Europeia não considerava a Proposta adequada nas circunstâncias do momento. Além disso, era altamente improvável que viesse a atingir as receitas fiscais previstas.

A mesma Federação acredita firmemente que quaisquer preocupações derivadas de potenciais ineficiências do mercado ou possíveis riscos sistémicos deveriam ser resolvidos através de uma adequada regulamentação e supervisão dos mercados financeiros e não pela via de um ITF.

A aprovação pelo Conselho da Introdução do ITF através do processo de “cooperação reforçada”, deixa apenas espaço para introduzir os melhoramentos adequados à Proposta de Directiva da Comissão.

Mas não deve à partida deixar de se fazer uma observação fundamental: Como se pode compreender que se procurem aperfeiçoar e introduzir mecanismos que contribuam para a integração financeira na Europa e que partem do princípio de que se deve obter um level playing field para os operadores do sector financeiro e, ao mesmo tempo, se introduza um novo imposto, a vigorar apenas em alguns Estados-membros, de que resultam desvantagens competitivas e elevados risco de transferência de actividades e proveitos para os que não o aplicam?

Procuraremos, sumariamente, elencar as principais observações que nos ocorrem (sem conhecimento ainda do que vai ser a Directiva final) em função do estado da “arte”, ficando à inteira disposição da Comissão e dos Senhores Deputados não só para o aprofundamento destas matérias, como para lhes fornecer contributos futuros que visarão a estabilidade e solidez do sistema financeiro e o desenvolvimento económico do nosso País.

II. Proposta de Imposto sobre as Transacções Financeiras Europeu

A recente Proposta da Comissão Europeia para Decisão do Conselho tem por objectivo estabelecer um conjunto de medidas específicas no domínio do ITF, que na prática correspondem ao estabelecimento de uma directiva sobre um sistema comum de ITF.

Conforme resulta da referida Decisão, a proposta de directiva será, em grande parte, baseada na proposta inicial da Comissão de Setembro de 2011, tanto em termos de âmbito material como de objectivos.

A Decisão em si não contém elementos que nos permitam, para já, determinar qual será a estrutura e modo de funcionamento do ITF Europeu.

No entanto, e uma vez que é a própria motivação de Proposta de Decisão do Conselho que indica que a sua inspiração será o anterior projecto da Comissão Europeia, é nos possível desde já apresentar as seguintes conclusões.

A Proposta de FTT original assentava no pressuposto de que deveriam ser aumentadas as contribuições dos bancos para as finanças públicas. Ora, este pressuposto assenta num preconceito de que o sector financeiro é menos taxado do que outros sectores.

Um dos objectivos será, portanto, o de criar tributação adicional para o sector bancário, evitando que os custos relativos a esta sejam suportados pela generalidade dos contribuintes.

No entanto, a proposta de Directiva original não levava em conta os elevados custos suportados pelo sector bancário, quer no âmbito fiscal, quer no âmbito do reforço regulatório prudencial e comportamental, nem a evolução da economia e do sector.

Analisemos este pressuposto, de que a carga fiscal sobre o sector financeiro é reduzida.

a) Convicção errónea de que a carga fiscal sobre os bancos é reduzida 

No actual contexto político verifica-se que há uma tendência geral para se considerar que os bancos devem ser tributados mais severamente, sem que seja apresentada uma fundamentação detalhada desse agravamento de tributação.

  • Ora, a generalidade dos bancos não constitui uma ameaça para a estabilidade financeira; e 
  • Tal como bolhas imobiliárias e tecnológicas demonstraram, a instabilidade financeira pode ter origem noutros sectores económicos não directamente relacionados com produtos ou serviços financeiros.

Por outro lado, pretender que os bancos sejam sujeitos a uma tributação específica porque estiveram na origem da crise e devem ser “punidos” não corresponde à verdade em muitos países e, nomeadamente, em Portugal, já que os bancos portugueses, no período que antecedeu a crise da dívida soberana demonstraram grande resiliência, não tendo recorrido a ajudas do Estado para aumentar o capital, encontravam-se de boa saúde, sólidos e rentáveis e intervieram, como deviam, no mercado, com vista a financiar a República, adquirindo dívida pública portuguesa quando mais ninguém no mercado estava disposto a assumir o risco de a comprar. Foi a crise da dívida soberana, ao contrário, que criou problemas aos bancos.

Por outro lado, fundamentar o agravamento da carga fiscal dos bancos portugueses alegando que estes estão sujeitos a uma carga fiscal reduzida também é uma falsa leitura.

b) Impostos aplicáveis ao sector bancário

Com efeito, as regras fiscais aplicáveis ao sector bancário não são mais vantajosas visto que:

  • Os bancos estão sujeitos a IRC, em termos equivalentes aos das empresas dos outros sectores. 
  • As regras específicas aplicáveis aos bancos, por exemplo, em matéria de imparidades, estão relacionadas com o enquadramento regulamentar específico que lhes é imposto, não lhe conferindo qualquer vantagem face a outros sectores.
  • Os benefícios fiscais aplicáveis ao sector bancário são os mesmos que se aplicam a qualquer outra empresa. A única excepção que existia era o regime das sucursais financeiras exteriores na Zona Franca da Madeira, que cessou em 31 de Dezembro de 2011, da qual resultava uma isenção de imposto quanto aos rendimentos aí obtidos. Note-se, no entanto, que há já vários anos esta isenção estava limitada a 15% do lucro tributável global da instituição de crédito, o que reduzia substancialmente o seu impacto. 
  • No que toca ao imposto do selo, os bancos também não têm quaisquer vantagens face a empresas de outros sectores económicos.

Para além destes, incidem sobre os bancos outros impostos específicos que não incidem sobre empresas de outros sectores:

    • Tributação autónoma de bónus e outras remunerações variáveis pagas a gestores, administradores ou gerentes que representem uma parcela superior a 25% da remuneração e possuam valor superior a €27.500, introduzida pela Lei do Orçamento do Estado para 2010, que foi aplicada à taxa de 35% na generalidade dos sectores, mas no caso de bónus e outras remunerações variáveis pagas ou apuradas em 2010 por instituições de crédito e sociedades financeiras a administradores ou gerentes, foi à taxa de 50%.
    • Contribuição Extraordinária sobre o Sector Bancário , introduzida na Lei do Orçamento do Estado para 2011, que se tem mantido desde então, e que incide sobre: 
    • O passivo apurado e aprovado, deduzido dos fundos próprios de base (Tier 1) e complementares (Tier 2) e dos depósitos abrangidos pelo Fundo de Garantia de Depósitos, até ao limite do montante garantido, a taxas que variam entre 0,01% e 0,05%; e
    • O valor nocional dos instrumentos financeiros derivados fora do balanço, a taxas que variam entre 0,0001% e 0,0002%.

A receita obtida com esta contribuição extraordinária em 2011 foi de cerca de 140 milhões de euros e em 2012 prevê-se que seja ligeiramente superior.

c) Isenções que alegadamente beneficiam o sector bancário: IVA

Adicionalmente, e por vários motivos, entre os quais são de salientar as dificuldades em identificar e determinar o valor acrescentado nas actividades de intermediação, a maior parte dos serviços e operações financeiros encontra-se isenta de IVA.

Sublinhe-se que esta isenção não é um fenómeno exclusivamente português, sendo a regra a nível mundial. Mas acima de tudo, há que ter em conta que a isenção dos serviços financeiros não é um benefício para as instituições financeiras, mas antes para os consumidores, que não pagam IVA pela utilização deste tipo de serviços.

Pelo contrário, a isenção em causa limita a possibilidade dos bancos deduzirem o IVA que tenham suportado. Com efeito, e contrariamente à generalidade das empresas, os bancos só podem deduzir o IVA que tenham pago na qualidade de adquirente de produtos e serviços, no regime do pro rata.

Por outro lado, a Directiva terá como outro objectivo limitar actuações especulativas no mercado que são consideradas indesejáveis, auxiliando à sua estabilização. É, no entanto, controverso, entre os especialistas desta matéria, se tal objectivo pode ser alcançado por essa via.

No entanto, se forem adoptados os moldes que se encontravam previstos no Projecto da Comissão, a directiva terá como consequência a redução da liquidez dos mercados financeiros.

Na avaliação que acompanhava a Proposta da Comissão, esta indicava expressamente que, em virtude da implementação do regime proposto, dar-se-ia uma redução do mercado europeu de derivados na ordem dos 90%. O facto de a Comissão considerar que esta redução seria aceitável é muito controverso, já que indicia alguns preconceitos sobre a utilização de derivados, ou, por outras palavras, admitirá que todas as transacções de derivados têm, necessariamente, carácter especulativo.

Um ITF poderá ter como consequência um aumento do custo dos serviços financeiros, desencorajando a procura destes produtos por consumidores dos mesmos.

Se um dos objectivos é, de facto, provocar uma redução substancial do mercado de derivados, então a gestão de risco financeiro tornar-se-á ainda mais complexa, visto que os bancos e seus clientes estarão impossibilitados de recorrer a um mecanismo tradicional de gestão de risco.

Tal não fará nenhum sentido nos derivados para cobertura de risco, que têm precisamente por objectivo mitigar riscos de investimento, e que são frequentemente utilizados para prevenir possíveis perdas de valor, tanto para os bancos, como para os seus clientes.
Repare-se que o legislador francês teve em conta esta diferenciação, estabelecendo que as operações de derivados para fins de cobertura de risco estão isentas de ITF.

Por último, um dos objectivos do ITF é o de gerar receita fiscal. No entanto, a estrutura subjacente à decisão de cooperação reforçada, ou seja, a implementação do imposto em apenas 11 dos Estados-membros, implicará, o risco de a deslocalização de certas actividades para os outros Estados-membros nos quais o ITF não será implementado.

Por outro lado, pode haver casos em que o imposto cobrado poderá mesmo ser superior à margem obtida pelo investidor nas transacções, o que implica uma redução do volume de transacções realizadas e, consequentemente, a redução da liquidez dos mercados dos Estados-membros que implementarem um ITF.

Este receio de redução de liquidez não é infundado. Há um exemplo recente que demonstra cabalmente essa ocorrência.

Como é sabido, a França tomou a iniciativa de implementar, a título individual, um ITF.
Um dos principais problemas do imposto francês decorre da sua natureza extraterritorial, pois o imposto é pago, independentemente do local onde a transacção é realizada.
Deste modo, qualquer entidade que pretenda adquirir instrumentos financeiros emitidos por entidades francesas tem de pagar, mesmo que não haja qualquer outro elemento de conexão com o território francês.

Desde 1 de Agosto de 2012, data em que o imposto francês entrou em vigor, assistiu-se a uma redução da liquidez do respectivo mercado, traduzida numa diminuição, na ordem dos 18%, do número de transacções sobre alguns instrumentos financeiros franceses e correlato aumento de 16% no investimento em instrumentos financeiros semelhantes, emitidos por entidades não-francesas .

Em suma, os dados relativos ao ITF francês confirmam que a implementação de um imposto deste tipo fomenta o risco de fuga de capitais para fora do país, risco esse que igualmente existirá no caso de o imposto ser apenas adoptado por alguns dos países e não por todos os Estados-membros da União Europeia.

Há ainda quem defenda que os efeitos deste tipo de imposto dependem fundamentalmente da estrutura dos mercados, que não é homogénea nas diversas geografias. O impacto em investidores institucionais, como fundos de investimento, fundos de pensões, poderá igualmente ser relevante.

Existem ainda Problemas técnicos relativos ao ITF Europeu que importa considerar:

Para além das razões de fundo, que motivam a nossa reserva e oposição ao ITF, o Projecto original da Comissão Europeia suscitava as seguintes preocupações de ordem técnica que, face ao facto do Projecto de Decisão do Conselho considerar que aquele será o ponto de partida da futura directiva, continuam a estar na ordem do dia:

- A territorialidade do imposto

De acordo com a Proposta da Comissão é devido imposto em qualquer transacção na qual participe, tanto por conta própria, como por conta de um cliente, uma instituição financeira estabelecida num Estado-Membro, mesmo que não haja qualquer outro elemento de conexão com esse Estado-membro.

De acordo com a Proposta da Comissão o imposto também seria devido por entidades financeiras que não se encontrassem estabelecidas na União Europeia que celebrassem uma transacção com uma entidade financeira estabelecida na União Europeia.
O referido regime foi estabelecido com base num pressuposto: o de que todos os Estados-membros implementariam o imposto.

A leitura adaptada deste regime, mas agora limitada aos países que integram o procedimento de cooperação reforçada, é motivo de preocupação.

Com efeito, coexistirão dois regimes distintos na União Europeia. Um em que não é devido qualquer imposto, quando a contraparte for uma entidade estabelecida num Estado-membro que não implementou o imposto. Outro, em que é devido imposto, porque a contraparte se encontra estabelecida em Estado-membro que implementou o imposto.

Perante esta opção, é claro o risco de entidades financeiras que se encontram estabelecidas fora União Europeia e pretendam realizar investimentos na Europa, optarem por países que não implementaram o IFT. Paralelamente, há também o risco dessas entidades recomendarem aos respectivos clientes interessados em investir em território da União Europeia, que evitem os países onde o IFT for estabelecido e se concentrem noutras praças financeiras.

Se tivermos em conta que estão fora do procedimento de cooperação reforçada, países como o Reino Unido e o Luxemburgo, cujos mercados financeiros têm uma enorme dimensão e importância a nível europeu, é muito natural que os investimentos se concentrem nessas praças, e o mesmo se diga do investimento “doméstico”, na medida em que nada impede os investidores dos Estados-membros onde o IFT seja implementado de procurarem outras praças financeiras da União Europeia ao abrigo do princípio da livre circulação de capitais.

- Ordens de Bolsa: o problema do momento em que se liquida o imposto

De acordo com a Proposta da Comissão, o imposto deve ser liquidado no momento em que a transacção ocorra.

No entanto, não há indicação de qual o momento em que a transacção se considera concluída.

A principal preocupação dos bancos prende-se com a tributação de operações realizadas em mercado regulamentado, seja a título de negociação por conta própria, seja na negociação por conta dos seus clientes.

É essencial que a tributação destas operações se verifique apenas após a fase de liquidação e compensação.

Uma ordem de compra ou de venda em bolsa é apenas e somente isso: uma ordem, que pode ou não ser concretizada, em função dos valores que se encontram disponíveis no mercado (ordem de compra) ou em função da existência de compradores dispostos a pagar o preço de venda (ordem de venda).

A ordem de bolsa só constitui um efectivo negócio após se ter atingido a fase de liquidação.

Nessa medida, a tributação das transações financeiras não pode incidir sobre as ordens, sob pena de, nos casos em que essas ordens não se executam, se estar a tributar um “não-negócio”.

Acresce que pode não ser possível saber qual é o valor efectivo da ordem de bolsa no momento em que esta é executada em mercado. Não sendo possível saber de antemão o valor destas operações, torna-se impossível ter um valor de referência fixo sobre o qual a taxa incide no momento de execução da operação e, consequentemente, saber qual o montante de imposto a liquidar.

A mesma impossibilidade de tributar por ausência de valor de referência fixa verifica-se também nos casos de variação de quantidade entre o momento em que a ordem de bolsa é dada e o momento em que é concretizada. Tratam-se de casos em que a ordem de venda ou de compra se reporta a um determinado número de títulos, não sendo depois possível, por razões de mercado, vender ou comprar a totalidade dos títulos visados pela ordem.

Por outro lado, a Proposta da Comissão estabelecia que o ITF é pago à Administração Tributária imediatamente se a transacção for realizada por meios electrónicos e no prazo de três dias no caso em que a transacção for executada por qualquer outro meio.

Se for mesmo intenção do legislador que o imposto seja liquidado ainda antes da liquidação e compensação das transacções, então os bancos estarão a pagar um imposto por uma transação que não ocorreu e consequentemente a Administração Tributária terá de devolver os montantes já pagos.

Se, no entanto, a intenção for a de que o imposto seja apenas pago após a liquidação e compensação da ordem de bolsa, ainda assim os bancos terão grandes problemas de gestão operacional, já que os custos associados à criação de estruturas de sistemas de informação que permitam a liquidação diária de imposto são muito elevados.

Por outro lado, a liquidação diária de impostos pode criar implicar problemas adicionais para a gestão de tesouraria e liquidez dos bancos, já que o volume de pagamentos/transferências diárias dos bancos aumentam substancialmente.

Mesmo o prazo para a liquidação do imposto relativo a transacções realizadas por meios que não electrónicos é muito reduzido (três dias).

Como tal, seria preferível que a transferência e correlato reporte dos montantes cobrados a título de imposto para a Administração Tributária se realizasse numa base mensal.

- A necessidade de desenvolver os sistemas de informação para liquidar o imposto

Diariamente os bancos portugueses executam milhares de transacções financeiras. Como tal, um imposto desta natureza, que potencialmente incidirá sobre milhares de transacções, tem de ser objecto de tratamento massificado ao nível dos sistemas de informação dos bancos.

Independentemente das opções concretas que venham a ser tomadas quanto ao imposto, os bancos vão necessitar de tempo para desenvolver os seus sistemas de informação de maneira a que seja possível o processamento automático do imposto que incide sobre milhares de transacções executadas diariamente.

III. Implicações específicas para Portugal

Conforme amplamente referenciado na 6º revisão do PAEF por parte do FMI (jan.2013), um dos elementos cruciais do processo de ajustamento da economia portuguesa relaciona-se com a redução do grau de endividamento excessivo das empresas, motivado por razões históricas, incentivos fiscais ou insuficiência de profundidade dos mercados financeiros. Advoga-se (parágrafo 44 do documento do FMI relativo à 6º revisão, pg 18) que “(…) iniciativas para promover os mercados de capitais poderão contribuir para a diversificação das estruturas financeiras das empresas (…)”. Neste contexto, a aplicação de uma TTF não selectiva afigura-se inadequada;

- A prática de gestão do risco financeiro em Portugal já de si é pouco atrativa em função do elevado custo implícito que representa para as PMEs (deseconomias de conhecimento, de escala e de reporte). Acrescer a este desincentivo por via fiscal contribuirá ainda mais para criar um fosso de competitividade potencial entre PMEs e grandes empresas;

- A fraca profundidade dos mercados portugueses associado a uma tributação adicional sobre transacções financeiras poderá concorrer adicionalmente para o desinteresse de investidores não residentes, reduzindo a base potencial de investidores e por essa via constituir factor de incremento do custo de financiamento da economia;

- Numa zona de quase livre mobilidade de capitais e de prestação de serviços, como a área do euro, diferenças de fiscalidade e/ou regulatórias constituem importantes mecanismos de localização de registos de transações financeiras/atividades económicas, donde a importância de existir um quadro mínimo harmonizado em termos de requisitos mínimos de regulação e ou de fiscalidade. Neste registo, a opção por quadros mais atrativos deste âmbito deve restringir-se a situações de índole extraordinária, como é a actual, em que se pretende revigorar a atividade económica de zonas económicas deprimidas. É essa a razão da negociação em curso para uma taxa especial de IRC em Portugal, argumento que poderia ser igualmente aplicável para uma discriminação positiva na aplicação da ITF em Portugal;

- O impacto em termos de volume de negócios, ou de custos decorrente do efeito restritivo associado a uma maior carga tributária sobre as transações financeiras, em prejuízo dos planos de recuperação dos bancos e da evolução perspectivada para o sector;

IV. Conclusões

Os efeitos directos de um aumento da tributação sobre as transacções financeiras prendem-se com a redução na liquidez dos mercados, na medida em que desincentiva à realização de operações; com o aumento dos custos para o intermediário/cliente final, em função da capacidade de repassagem de custos intermédios para o preço final; e efeitos de segunda ordem relacionados com a relocalização de atividades para outros países com um quadro regulamentar e fiscal mais atrativo.

Nesse sentido, face à incerteza dos efeitos de tal medida e ao contexto genericamente adverso para a sua implementação, sugere-se: (i) aferir impactos e adequação com a experiência francesa em curso; (ii) proceder a uma identificação de atividades financeiras que poderiam estar sujeitas a uma tributação desta natureza, com respetiva segmentação e inclusão de atividades similares promovidas por instituições que não bancos, de modo a reduzir o potencial de arbitragem regulatória e os efeitos colaterais contrários à redinamização do mercado de capitais enquanto fonte alternativa de financiamento e de robustecimento da estrutura financeira das empresas portuguesas.

Fotografia de António Pedro Ferreira