23 de Julho, 2020

A aprovação pela Assembleia da República de um conjunto de diplomas relacionados com comissões bancárias é uma cedência ao populismo. Este conjunto de diplomas suscita diversas questões de constitucionalidade, fere princípios fundamentais do funcionamento da economia de mercado e afronta a racionalidade, a prudência e a preparação do futuro. O seu alegado objetivo de proteção dos consumidores pode revelar-se  contrário ao interesse  da economia e dos cidadãos.

É inexplicável que, numa situação em que o setor bancário é absolutamente essencial, apoiando famílias e empresas, para a recuperação de uma crise de dimensão sem precedentes, em vez de se contribuir para que a banca esteja nas melhores condições possíveis para o fazer, se adotem medidas que a fragilizam ainda mais, aumentando custos, como o Adicional de Solidariedade, e proibindo a cobrança de receitas absolutamente legítimas, como é o caso das comissões bancárias.

A  banca não é um serviço público gratuito. É uma atividade empresarial que tem de cobrir os custos do seu funcionamento para garantir o cumprimento das suas obrigações perante os depositantes, financiar a economia e os cidadãos e prestar uma multiplicidade de serviços, com valor para o cliente bancário, e pelos quais deve poder ser remunerada.

A rentabilidade dos bancos, que se encontrava em recuperação mas sendo, ainda assim, das mais fracas da Euro Área, está novamente sob fortíssima pressão, fruto dos impactos da atual crise. Ainda esta semana a Moody´s  considerou que a banca nacional está entre as que enfrentam maior risco de perdas.

Se o contexto atual é extremamente desafiante, os bancos serão ainda mais penalizados com a aprovação destas medidas – que se vêm juntar a outros entraves já existentes - que impedem a livre fixação dos preços e limitam a concorrência. A proteção do consumidor tem de ter em conta todas as implicações futuras, nomeadamente em termos de estabilidade financeira, não podendo exclusivamente visar o curto prazo.

Se é inegável que a banca terá que ser parte da solução para a retoma, que razões podem levar à adoção de medidas que o dificultam?

Se é por todos reconhecido que o pior que pode acontecer ao nosso país é haver uma nova crise financeira na sequência da crise COVID19, como é que se explica que se continue a trilhar um caminho que fragiliza o sistema bancário?

Qual será a perceção dos investidores em relação ao nosso país face a estas distorções dos princípios em que assenta a economia de mercado? Não se entenderá que este tipo de medidas afasta o interesse dos investidores – e não apenas no setor bancário? Portugal necessita de volumes enormes de investimento produtivo novo, para sair da crise e sustentar o futuro, e terá que competir com os restantes países europeus pela sua atração.

Qual o incentivo a investir em tecnologia e inovação, proporcionando um melhor serviço e comodidade aos clientes, quando se é impedido de poder cobrar por tais serviços?

Qual o interesse, na ótica do investidor bancário, de sediar uma instituição financeira em Portugal, quando pode oferecer serviços financeiros de qualquer outro Estado Membro sem estar sujeito a todas estas limitações?

Em Portugal, contraria-se repetidamente o objetivo de level playing field  contido na União Bancária, com medidas que penalizam o nosso sistema bancário e o impedem de competir com os pares europeus e com novos atores em igualdade de condições.

Este conjunto de iniciativas legislativas foi objeto de um leque alargado de pareceres e audições, mas o Parlamento entendeu não tomar em conta alguns dos avisos das Autoridades de Regulação/Supervisão, nem as posições, muito sustentadas, das Associações Financeiras.

Esta aprovação irá certamente ter repercussões nos agentes económicos portugueses, que precisam de poder contar, com redobrada importância e urgência, no atual contexto, com um sistema financeiro saudável e assente em práticas transparentes. Só assim será possível assegurar a prosperidade e a competitividade do país.