Portugal está a realizar um difícil Programa de Ajustamento que tem três vertentes fundamentais – a consolidação orçamental e o reequilíbrio das finanças públicas, as reformas estruturais e o crescimento económico.

A consolidação orçamental obriga a exigentes e dolorosas medidas de austeridade e é sabido que austeridade e crescimento são pouco conciliáveis. Assim, numa primeira fase de um processo de ajustamento, a recessão e o empobrecimento são inevitáveis. Por isso, estes programas só são possíveis num clima de compreensão cívica, coesão social, compromisso, estabilidade política e solidariedade activa. Durante esta fase, é comum haver transferência significativa de activos para outros accionistas e, em muitos casos, perda de centros de decisão.

A passagem da recessão para o crescimento económico é potenciada pelas reformas estruturais entretanto realizadas com a finalidade de diminuir os custos de contexto e de gerar ganhos de competitividade apreciáveis, que incluem também a diminuição dos custos com pessoal, a melhoria da eficiência operativa e o impacto da inovação.

A questão fulcral do nosso País é a de como acelerar a criação de riqueza que permite passar para um crescimento positivo. É que o crescimento do PIB é fundamental para atingir o reequilíbrio das finanças públicas (é o denominador dos rácios…) e para criar emprego, aumentar os proveitos de cidadãos e empresas, impulsionar o consumo.

Ora, para isso, é necessária capacidade empresarial de investimento e assegurar o financiamento da economia, das empresas.

O financiamento das empresas passa por várias vias: depende da capacidade de investimento e da suficiência de capitais próprios; da capacidade de obter crédito em condições razoáveis; do recurso ao mercado de capitais, designadamente, no que respeita a emissão de obrigações; da normalização dos prazos de pagamento nas relações entre empresas e entre o Estado e as empresas.

Na Europa, dois terços do financiamento das empresas provém do crédito bancário (nos EUA, 70% é obtido no mercado de capitais). É, pois, bem conhecido o peso que a obtenção de crédito tem no financiamento das empresas portuguesas.

Sabemos que a dívida das empresas portuguesas chegou a representar 137% do PIB, um dos valores mais altos da União Europeia, próximo da espanhola (138%) e seguida pela inglesa (113%) a francesa (110%), quando na Alemanha representava apenas 50% do PIB.

As Empresas, tal como o Estado, os particulares e os Bancos, tiveram e têm, assim, necessidade de reduzir o seu endividamento. Por outro lado, na conjuntura actual, muitas dela enfrentam problemas que se reflectem negativamente nos balanços, prejudicando o acesso ao crédito. A recapitalização das empresas surge, assim, como elemento fulcral para o crescimento económico.

Quando os seus accionistas não conseguem, por si, realizá-la, justifica-se a utilização de alternativas:

  • Entrada de novos accionistas;
  • Parcerias com outras empresas, podendo visar a sua consolidação ou processos associativos;
  • Recurso a capital de risco nas suas diferentes vertentes (e é pouco explicável a escassa utilização deste instrumento…);
  • Instrumentos inovadores e formas diferentes das usuais de reforço de capital, nomeadamente, a criação de fundos de recapitalização, privilegiando as boas empresas exportadoras;
  • Reestruturações dos seus créditos, com eventual transformação da parte da dívida em capital e com reforço da “governance” das empresas;
  • Maior utilização do mercado de capitais;
  • Integração em fundos de reestruturação.

Os Bancos portugueses, que revelaram notável resiliência ao longo de todo o período de crise financeira, que já vai em seis anos, têm, com clareza, a noção de que devem contribuir activamente e mesmo ser motores do crescimento económico, participando não apenas na concessão de crédito, mas proporcionando contributos para o fortalecimento das empresas. O papel dos Bancos é efectivamente insubstituível para garantir o financiamento da economia.

Por isso, no programa de Assistência Económico Financeira negociado com a TROIKA, incluiu-se um 4º Pilar, destinado a assegurar a estabilidade financeira e o reforço das instituições bancárias, de modo a garantir o financiamento da economia. As acções previstas visam a solvabilidade e a solidez dos bancos e constituem o elemento central da estratégia e da gestão dos bancos.

A crise da dívida soberana provocou, naturalmente, uma desaceleração do crescimento dos activos dos bancos e da concessão de crédito.

O crédito às empresas, que havia crescido 7% ao ano entre 2001 e 2008, abrandou o seu ritmo de crescimento para 0,5% entre 2008 e 2010 (enquanto na Europa caiu -0,8%) e registou, entre Janeiro de 2010 e Junho de 2012, uma queda anualizada de 2,6%.

Esta diminuição da concessão de crédito às empresas deriva de três tipos de razões:

  • Recessão económica, aumento do incumprimento e uma diminuição da procura de crédito;
  • Condicionantes estruturais do sector bancário: obrigação de desalavancagem (o rácio de transformação crédito/depósitos diminuiu de 147% em Junho de 2011 para 137,7% em Junho de 2012); as dificuldades de liquidez, atenuadas pelo recurso crescente ao BCE, que tornou a situação actual confortável; rácios de capital mais exigentes que em bancos de outros países europeus; restrição à geração de resultados para a reposição da base de capital (imparidades, custo do funding de clientes, rigidez no pricingdo crédito à habitação, inflexibilidade no ajustamento da base de custos).
  • Debilidade do balanço das empresas, descapitalizadas e demasiado alavancadas, o que faz com que as operações não passem o crivo da avaliação de risco feita pelos bancos; falta de garantias apropriadas.

No entanto, todas as empresas com balanços aceitáveis não terão dificuldade em obter crédito (à exploração, à tesouraria e para investimento).

Não há economia saudável sem uma banca forte e com elevado sentido de responsabilidade social.

Os bancos portuguesas, com uma situação de liquidez agora mais confortável, com níveis de solvência elevados (os mais altos de sempre), bem provisionados, embora com fortes pressões sobre a sua rentabilidade, não deixarão de cumprir a sua missão de financiar a economia.

Fernando Faria de Oliveira

Presidente da Associação Portuguesa de Bancos

Lisboa, 26 de Setembro de 2012