A actividade bancária está a exercer-se num contexto deveras difícil e complexo.
O novo paradigma do sector bancário é ditado:

  • por um lado, pelo novo quadro regulatório e de supervisão e pela União Bancária em construção e já em acção no que respeita ao SSM e SRM;
  • por outro lado, pelos impactos da era digital na banca, pela inovação tecnológica e financeira, em desenvolvimentos permanentes e,
  • e ainda, pelas novas exigências a nível comportamental e de protecção do cliente e pelo apuramento da governação das instituições.


 Estamos, obviamente a referir-nos a um paradigma necessariamente muito dinâmico.
Vou cingir-me aos principais desafios que temos de enfrentar no futuro próximo e que considero serem os seguintes:

  1. o sistema bancário como vector e parceiro para o crescimento económico;
  2. o novo quadro regulatório e de supervisão e as suas implicações;
  3. a banca digital e o sistema de pagamentos;
  4. a recuperação da reputação do sector;
  5. o impacto da resolução do BES no sistema bancário
  6. a retoma da rentabilidade e as suas implicações.



1. O FINANCIAMENTO DA ECONOMIA

Portugal tem três grandes constrangimentos para atingir um crescimento económico que sustente o nosso desenvolvimento

    -    a nível das finanças públicas, a necessidade de reduzir a despesa para possibilitar um desagravamento fiscal, indispensável para atrair investimento e aumentar a procura interna – o que significa definir e pôr em marcha a Reforma do Estado (Administração Pública, Segurança Social, dimensão dos Serviços Públicos), sabendo que tal implica compromisso político, diálogo social e tempo.

    -    O segundo constrangimento é a sub-capitalização e o sobreendividamento das empresas, que dificulta o seu acesso ao crédito, o seu crescimento e o da economia

    -    O terceiro, é o do investimento (diria sub-investimento), onde se requer um forte impulso, numa conjuntura com vários aspectos desfavoráveis para atrair os investidores e penalizado pelos dois primeiros constrangimentos.

Ora, não existe investimento sem financiamento, verdadeiro pilar do desenvolvimento.

Em Portugal, como na Europa, mais de 70% do financiamento das empresas resulta do crédito bancário.

E, depois do período em que a banca teve de realizar uma forte, mas rápida e  ordenada, desalavancagem, com o rácio de transformação a cair de 158% em Junho de 2011 para os actuais 107%, implicando alguma redução do crédito, a banca está hoje plenamente preparada e sem restrições de liquidez para conceder crédito a empresas que cumpram os requisitos para o obter.

Acresce (como repetirei) que os bancos são os primeiros interessados em aumentar os seus proveitos, designadamente em termos de aumento do volume do crédito.

É necessário desmentir um “chavão” corrente, de que "o crédito não chega à economia por culpa dos bancos".

Aquilo que devia ser o “discurso” correcto é que, para poderem ter acesso ao crédito bancário, as empresas devem dotar-se de capital, apresentando rácios de autonomia financeira adequados, tornar transparentes os seus balanços e aperfeiçoar a sua informação contabilística e de gestão e submeter business plans credíveis, para poder passar o crivo da avaliação de risco.

Mas, por outro lado, o Sector Bancário está a cooperar com outros sectores financeiros no apoio e promoção de uma nova agenda para o crescimento e o emprego, posicionando-se como o principal vector e parceiro no financiamento das empresas, que deve, no entanto, saber utilizar fontes de financiamento alternativas.

Os bancos estão também disponíveis para prestar expertise junto das PME, para que estas possam vir a concretizar o objectivo de acesso ao financiamento.

O problema que hoje enfrentamos e é contrário ao interesse dos bancos é que a procura de crédito solvente é ainda escassa.

2. NOVOS QUADROS REGULATÓRIOS E DE SUPERVISÃO
Os bancos enfrentam um quadro regulatório e de supervisão muito exigente, complexo, incerto em muitos aspectos técnicos, por vezes redundante (como é o caso da adição de regulações baseadas em rácios distintos, para assegurar que se um falha, os outros podem suprir essa falha). Seguindo JOSE MARIA ROLDAN, Presidente da AEB, dou um exemplo:
Em Basileia II, exigia-se que o capital de maior qualidade dos bancos (acções com direito a voto e reservas) fosse superior a 2% dos activos ponderados pelo risco.
Em Basileia III, essa exigência passou para 7%, e foi acrescida de mais nove requisitos

  • exigência de mínimos de Capital TIER 1 e TIER 2
  • exigência de mínimos de Capital de qualidade (ou CT1)
  • exigência de mínimos de Capital de maior qualidade (CET 1) (Common Equity Tier 1)
  • buffers de capital contracíclico
  • buffers de capital de conservação
  • rácios de liquidez de curto e longo prazos
  • limites de endividamento (rácios de leverage)
  • exigências em matérias de resolução (nomeadamente para os bancos internacionais)


Passou-se de um rácio de capital em Basileia II para dez rácios distintos em Basileia III.
À tradicional supervisão de solvência (prudencial), juntam-se agora a supervisão macro-prudencial, a comportamental e a de resolução.
À questão da redundância pode ainda acrescentar-se uma possibilidade de contradição ou contraprudência, como José Maria Roldan tambem exemplificou:
-    o rácio de liquidez de curto prazo exige que os bancos possuam uma almofada de activos líquidos – e os mais líquidos, de entre todas as classes de activos, são os títulos soberanos, representativos da dívida de Estado, que são os de menor risco.

Mas o rácio de leverage, em relação ao qual se exige uma percentagem fixa de capital independentemente do risco dos activos, acaba por penalizar as detenções de activos de baixo risco, o que é contraditório.

A European Banking Federation (EBF) e a Associação Portuguesa de Bancos sempre defenderam que é absolutamente necessário calibrar as medidas regulatórias, individualmente e na sua apreciação conjunta, avaliando rigorosamente os seus impactos na economia e as implicações no sistema, e que a definição de períodos de transição ajustados à capacidade de absorção e de execução por parte da banca era indispensável, para não ter impactos negativos na economia.
Começa a reconhecer-se, agora, que talvez se tenha ido longe ou depressa demais nalguma sobre regulação e que é talvez recomendável abrandar o ritmo.
Mas a verdade é que o pipeline de novas medidas é simplesmente, enorme! E os bancos têm de se preparar, de dotar-se capacidade de resposta – o que, se para os maiores tal é já um desafio, para os de menor dimensão é um problema maior, por terem menos recursos, em particular os humanos, o que pode dificultar o seu processo de ajustamento e resposta aos novos requisitos.

Também a União Bancária veio trazer um novo quadro muito exigente, tanto a nível da Supervisão como da Resolução.
Existe uma nova cultura de supervisão, com modelos, sistemas e práticas que se aplicam uniformemente em todos os Estados Membros, quer aos bancos sujeitos à supervisão directa do SSM, quer aos que são seguidos pelas Autoridades Nacionais sobre monitoragem do BCE (SSM).

O objectivo é o de uma harmonização transversal, um level playing field, uma progressiva mas rápida eliminação das “national discretions” ainda prevalecentes, algumas com períodos de transição ainda não terminados, outras justificadas por legítimas disposições nacionais. Não são também tomadas em consideração especificidades, culturas, necessidades conjunturais e interesses nacionais.

A absorção da nova cultura de supervisão e a adaptação a estas novas práticas é muito trabalhosa.
Vamos também assistir a um substancial desenvolvimento da Supervisão Comportamental, que incidirá na área das boas práticas e da ética na banca, no reforço das relações com os clientes, abrangendo a protecção dos consumidores e a educação financeira, no diálogo com os stakeholders, no governo das instituições e nas certificação para o exercício de funções bancárias, nomeadamente de front-office.

Em tudo deve prevalecer a justa ponderação e medida, para as soluções serem eficazes. O sector bancário obedece a dois grandes princípios: o da confiança (incluindo a segurança dos depósitos, ainda mais relevante se tomarmos em conta que os bancos gerem dinheiro que não é seu) e o da assunção de risco. Poderia ter consequências indesejáveis um quadro (de actuação e responsabilização inadequada)  que provocasse aversão e medo ao risco...

3. A REVOLUÇÃO DIGITAL E O SUE POTENCIAL IMPACTO SOBRE O MODELO DE NEGÓCIO DOS BANCOS

A inovação tecnológica é uma constante desde o início da revolução industrial, mas intensificou-se enormemente e a uma velocidade fantástica a partir da revolução digital da década de 70.
E está a ter um impacto muito forte em todos os aspectos da nossa vida, incluindo, obviamente, o financeiro.
As principais mudanças que a revolução digital introduziu centram-se

  • na descida do custo de armazenagem da informação
  • no aumento da capacidade do processo de informação
  • na descida do custo de transmissão da informação, mediante o uso de banda larga


“O Big Data, que pode definir-se como a utilização de grandes massas de informação para a detecção de padrões de consumo, potencial ou efectivo, que permitirão antecipar as necessidades destes, vão trazer um manancial de oportunidades e desafios.

O Big Data integra volume de informação, variedade de informação e velocidade de transmissão / obtenção de informação.

90% do stock mundial de data foi gerado nos últimos dois anos e meio! E 99% deste está digitalizado e mais de 50% já está disponibilizado pela internet.
A aplicação do Big Data na banca oferece a possibilidade de detectar padrões de gastos pelos consumidores, inclusivamente por segmentos (de idade, rendimento, etc) de maneira a permitir que a instituição possa melhorar a sua oferta de produtos financeiros (localização geográfica, ajustamento de horários comerciais, diversificação da oferta de bens e serviços, personalização de produtos, podendo, por exemplo, ser usada para apoiar os clientes na planificação da poupança, como à idade da reforma, etc).

Entretanto, a evolução tecnológica vem-se traduzido também no "disparo" de dispositivos móveis.

O telefone-móvel e o tablet estão no centro da revolução tecnológico-financeira, designadamente, na sua componente sofware.

O desenvolvimento da banca digital vai ser rapidíssimo e não compreende apenas a parte relativa aos canais de distribuição, ao sistema de pagamentos, mas, também, outras aplicações que estão a ter enorme impacto na gestão, nos processos, na automatização de muitas funções.

Em relação à banca digital há que considerar as questões relativas ao negócio e as respeitantes ao quadro regulatório.  No que se refere às matérias regulatórias, a focagem está a centrar-se principalmente na implementação do Pacote sobre Pagamentos (PSD2, etc), na inovação dos pagamentos, na protecção de dados, na necessidade de desenvolver um “bluepoint” para um ambiente da banca digital seguro (level playing field, acesso a contas bancárias, pagamentos, privacidade, utilização de Big Data).

No que respeita à área de negócio, foco-me apenas no dos PAGAMENTOS, onde os bancos devem tomar em conta a envolvente em que actuam, nomeadamente:

  • os efeitos do enquadramento regulatório, nomeadamente no que se traduz na redução de comissões a favor da protecção dos consumidores (novas pressões sobre preços e margens)
  • os efeitos da entrada de novos operadores, com relevo para os que já se encontram sob regulamentação financeira, designadamente os que são operados por via de um “mobile device”, como os vários “mobile wallet proveders”:
    •  Apple Passbook, Google Wallet, Lemon Wallet, Square Wallet, Paypal, Venmo, Isis, Dwolla, Bump Pay, Groupon app, Zipmark, etc, que são alguns dos actuais principais sistemas de pagamento por internet
    • os significativos impactos da era digital na redução dos custos – mudança dos custos de recursos humanos e de transacções (mas, com custos sociais importantes, que devem ser ponderados).  E, recordo, esta área dos pagamentos é tradicionalmente, fonte de prejuízos.
  • a questão, da maior importância, da ciber segurança e do combate à fraude informática

No que respeita à evolução deste mercado, aponto alguns números revelados pela BUSINESS INSIDER:

  • o avanço dos pagamentos móveis é avassalador 20% por ano e contrasta com a queda dos pagamentos tradicionais (cash e cheques – estes imenso)
  • os pagamentos P2P estão a disparar (em euros 2014 – 8 Bi, 2015 – 15Bi, 2018 – 68Bi)
  • os números de contas nos gigantes tecnológicos dispararam: em Julho 2014, era já: Apple 900M, Amazon 250M, PayPal 170M.  E só a PayPal movimentou 30Bi em 2013.
  • no entanto, estudos demonstram que os clientes preferem claramente que os seus mobile wallets pertençam ao seu banco (27% de preferências) v. 16% no PayPal, 12% na VISA, 5% nos grandes bancos americanos (Chase, BofA, American Express), 3% na Google, Apple, etc.


Estas alterações conduzem os bancos à necessidade de tomar decisões estratégicas de negócios .  Um relatório da McKinsey sugere algumas questões:

  1. Cooperar ou concorrer com os novos operadores?
  2. Conduzir ou delegar a agenda digital?
  3. Manter o negócio digital no negócio corrente ou separá-lo?
  4. Diversificar ou reforçar nas iniciativas digitais?
  5. Comprar ou vender áreas do nosso portfólio?
    ex: vender negócios que se tornavam menos atractivos com a era digital
    comprar competências para competir
  6. Seguir as preferências dos clientes ou influenciá-los
  7. Utilizar serviços e plataformas comuns?


4. RECUPERAR A REPUTAÇÃO DA BANCA
As causas e a origem da crise económica desencadeada pela crise subprime e a seguinte crise financeira estão frequentemente associadas à especulação financeira e às suas consequências (nomeadamente nos EUA e na Europa) e afectaram profundamente a reputação da banca.

Essa reputação, não obstante o reforço da regulação e a recuperação progressiva do sector bancário europeu, não está ainda completamente recuperada.
Em Portugal, os escândalos relacionados com o BPN e o BPP e, mais recentemente, com o BES, constituíram uma profunda machadada na imagem da banca.
E, no entanto, o sector bancária português havia tido um desempenho digno de registo durante a crise internacional 2008-2010, sendo um dos Estado Membros que menos utilizou os recursos públicos postos à disposição da banca para a enfrentas, e apenas utilizou garantias e não aumentos de capital.  Era um sector moderno e com bom desempenho.

Mas, a crise da dívida soberana afectou significativamente a banca, que dela foi vítima, contaminando os ratings, impedindo o acesso a funding nos mercados internacionais, e criando assim dificuldades de liquidez, conduzindo a requisitos de capital muito mais pesados e a planos de desalavancagem exigentes. Ao mesmo tempo, a inerente crise económica levou a elevados crescimentos das taxas de incumprimento (que, nas empresas, passaram de 1,5% em Dezembro de 2007 para 13,8% em 2014), das imparidades (que totalizaram 31 mil milhões de euros entre 2007 e 2014) e a uma forte pressão sobre a margem financeira (a Euribor caiu de 5,2% em 2008 para 0,3% em Junho de 2014). De tudo isto resultou que a rentabilidade dos bancos e a sua cotação caiu fortemente – o ROE passou de 17,7% em 2007 para -11,5% em 2013 e -19,2% em 2014(incluindo NOVO BANCO e BES)
Estes factos conjugados com novas exigências regulatórias levaram três bancos a recorrer à linha de recapitalização prevista no PAEF para aumentarem o seu capital.

A preparação e as acções tomadas pelos bancos para corresponder, ao mesmo tempo, aos requisitos da Troika, do Banco de Portugal e da nova regulação europeia e o seu desempenho face às alterações em curso, merecem forte registo positivo.

Deve também mencionar-se o substancial reforço da supervisão levado a cabo pelo BdP, com um modelo mais intrusivo, mais transversal e prospectivo, com enfoque numa apreciação rigorosa do risco, o aparecimento de novos instrumentos e acções de supervisão, como a comportamental, e a execução de inspecções transversais com o objectivo de assegurar que as imparidades reconhecidas pelos bancos eram adequadas e que a valorização dos colaterais associados às exposições era conservadora.  Efectuaram-se “stress tests” periódicos, inspecções especiais, auditorias externas extraordinárias sob o comando do Supervisor, os bancos tiveram de passar a submeter Planos de Funding e Capital, planos de contingência, planos de resolução e, no caso dos bancos que utilizaram a linha de recapitalização pública, planos de reestruturação.

Esta preparação dos bancos permitiu que os que foram sujeitos depois ao exercício do Comprehensive Assessement do BCE o pudessem realizar com sucesso, demonstrando que os balanços reflectem a sua realidade patrimonial, que os métodos de avaliação do risco são adequados e as carteiras de crédito estão devidamente avaliadas.

Enfatizo que o sector bancário é o mais escrutinado, regulado e supervisionado de todas as actividades económicas. E, mesmo podendo ocorrer sempre falhas de supervisão num ou noutro caso, é um facto que o Regulador ajudou a fortalecer o sistema e defendeu sempre o depositante, primeira obrigação da actividade bancária.

Refiro este reforço da supervisão em termos gerais. Não posso, nem devo, pronunciar-me sobre acções de supervisão individualizadas, sobre um qualquer determinado banco – a APB não só não tem qualquer intervenção nesta matéria, como desconhece factos e não emite juízos de valor.
Em meados de 2014, os bancos encontravam-se já com uma situação de liquidez confortável, apresentavam rácios de capital bem acima dos requisitos mínimos, mostravam maior apetência para conceder crédito solvente e as taxas de juro de crédito estavam já a descer. A rentabilidade, o tratamento do legacy e a atractividade do capital constituíam o seu maior desafio.

Neste quadro surgiu a impensável e deplorável crise do BES, contaminado pelo GES, e a necessidade de intervenção pelo Banco de Portugal.
Os efeitos imediatos da crise do BES traduziram-se:

  • em danos de imagem e reputacionais de grande impacto tanto para o sector bancário como para o próprio país. É, no entanto, necessário evitar generalizações injustas e prejudiciais ao próprio interesse colectivo, separando o trigo do joio.
  • em custos acrescidos para o restante sistema bancário, resultantes das contribuições para o Fundo de Resolução e dos impactos nos mercados financeiros, derivados daqueles danos de imagem.

O caso BES, depois do que aconteceu no BCP e dos casos BPN e BPP, mostra bem que as crises financeiras e económicas podem despoletar crises profundas em empresas e instituições financeiras, mas que são fundamentalmente, se tal se vier a provar, os actos ilícitos e o incumprimento das normas de gestão rigorosa, que podem conduzir a situações irrecuperáveis.  E estes comportamentos tão negativos tendem a afectar o todo, não se restringindo apenas no caso concreto.
Este dano reputacional é aproveitado para generalizar ataques de vários tipos ao sector bancário, potenciados por uma envolvente pré-eleitoral, por encontrarmos os reguladores sob pressão e requer actuações em vários domínios

  • no comunicacional, onde se reconhece a necessidade de manter a opinião pública melhor informada e devidamente esclarecida em relação a assuntos e dossiers actuais e sensíveis e, muito em particular, a compreender o funcionamento da banca e o seu papel essencial na sua vida e na economia
  • no do governo das instituições, com foco nos princípios de governo corporativo dos bancos (responsabilidades gerais do Conselho de Administração; composição e qualificações dos seus membros; estrutura e práticas do C.A.; gestão sénior, governo das estruturas do grupo; gestão de risco; identificação, monitoragem e controlo dos riscos; comunicação; compliance; auditoria interna; “disclosure” e transparência; remunerações; relações com superiores) e no reforço das estruturas de controlo interno dos bancos
  • num processo de auto-regulação, que compreende o cumprimento de códigos de boas práticas bancárias, de conduta e ética. Cito o Governador do Banco Central inglês : “ há uma crescente consciencialização da necessidade de acrescentar à competência técnica dos gestores bancários a questão, que porventura a suplante, da sua conduta.  A virtude não pode ser regulada.  O que é fundamental é a redescoberta dos valores essenciais e, em última análise, trata-se de ua questão de responsabilidade individual”.

O CEO do NY Fed afirmou: “A cultura de uma empresa está relacionada com as normas implícitas que guiam os comportamentos na ausência de regulamentos e regras de compliance. A cultura reflecte as atitudes prevalecentes e os comportamentos dentro de uma empresa, está relacionada com “o que devo fazer” e não com “o que eu posso fazer”.

  • num reforço de componente “relação com o cliente”, integrando o apoio e a protecção e o aconselhamento.


5. RESOLUÇÃO DO BES
Em termos genéricos, o modelo de Resolução dos Bancos, tal como configurado na BRRD (a Directiva sobre Recuperação e Resolução dos Bancos), não é isento de algumas questões controversas sendo, designadamente, de mencionar as relacionadas com a matéria de concorrência, onde se aplicam ao sector bancário soluções singulares numa economia de mercado.

Foram considerações ligadas à defesa da estabilidade financeira, de modo a evitar crises com potenciais impactos sistémicos, e à protecção dos contribuintes, minimizando eventuais intervenções do Estado, que levaram à concepção e adopção deste modelo.

O modelo de Resolução pressupõe que os custos da resolução de um banco em situação de iminente insolvência são suportados pelos outros bancos, numa solução de “mutualização”, através de contribuições para um Fundo de Resolução, que têm como contrapartida evitar eventuais riscos sistémicos, o que acaba por os beneficiar. Em imagem: a lógica subjacente ao modelo de resolução não é tanto salvar o banco que falhou mas quantos teriam falhado se esta medida não fosse posta em prática.

Embora “pague o justo pelo pecador”, ao fazer suportar pelos accionistas dos outros bancos os custos da resolução do banco em vias de insolvência e seu concorrente, esse benefício superará os riscos e inconvenientes de desvios de concorrência e conflitos de interesses possíveis.

Mas, se a diluição desses custos pela generalidade dos bancos europeus, quando o Fundo Único de Resolução estiver dotado, minimiza esses impactos, a situação é bem diferente quando nos reportamos ao nível nacional, em particular quando o “banco mau” tem dimensão relevante e a dispersão de risco é escassa. Acresce que o Fundo de Resolução Nacional, constituído em 2012, estava ainda incipientemente dotado. Foi o que transmitimos, então, quer ao Governador do Banco de Portugal, quer à Ministra das Finanças. Íamos ser pioneiros de uma solução para um banco insolvente de dimensão relevante, com potenciais imponderáveis, e com um Fundo insuficientemente capitalizado.

De facto, a originalidade da solução não pode deixar de comportar indefinições, incertezas e incógnitas e um potencial de contingências e litigância considerável.
No que respeita à não utilização da linha de recapitalização, foi-nos comunicado que esta ficava a dever-se, por um lado, ao quadro legal vigente e, nomeadamente, porque o BES não a havia solicitado. E, também, porque não permitindo a separação imediata entre “good bank” e “bad bank”, uma recapitalização pública poderia compreender contingências elevadas, que recairiam na esfera pública.

Os impactos em relação ao futuro dependem principalmente de três factores:

  • valor da alienação do Novo Banco, de que resultará o valor das contribuições para o Fundo de Resolução nacional;
  • impacto sobre o balanço dos bancos no plano prudencial e contabilístico;
  • exclusão da responsabilidade dos bancos – que não foram envolvidos na decisão da medida e no modelo de resolução do BES – pelo risco de litigância.

Por outro lado, os bancos consideram essencial que, no cômputo geral, mesmo no que se refere à exposição ao risco de insuficiência do valor de alienação para cobrir o montante do capital do Novo Banco por eles financiado através do Fundo de Resolução, a sua responsabilidade seja limitada, pelas seguintes razões:
Não contribuíram em nenhuma medida para a situação criada no BES (tendo, pelo contrário, sofrido a concorrência de um banco que, durante certo tempo, não cumpriu globalmente as regras da actividade);

Não dispunham de quaisquer meios para prevenir a ocorrência da mesma ou para mitigar os seus efeitos;

Não tiveram qualquer intervenção no processo de decisão (e, portanto, qualquer responsabilidade na adopção) da medida de resolução;

E, acima de tudo, uma exposição sem limites ao impacto patrimonial da resolução pode pôr em causa a solvabilidade dos restantes bancos, situação que a própria lei pretende salvaguardar e que, em última análise, iria originar um efeito negativo para os contribuintes que, justamente, se pretende salvaguardar.


6. A RENTABILIDADE DOS BANCOS, PRINCIPAL DESAFIO DO SISTEMA BANCÁRIO, E SUAS IMPLICAÇÕES
A rentabilidade dos bancos portugueses diminuiu ao longo dos últimos anos, não acompanhando o clima de recuperação, ainda que ténue, a nível europeu.
O ROE da banca portuguesa, foi:
- em 2007: + 17,6%; em  2010 : 7,7%; em 2011 :  - 6,3%; em 2012 :  - 5,5%; em 2013 : - 11,6% (na EU - 1,53%); em 2014 – - 19,2% (na EU + 2,19%)
Os resultados agregados consolidados foram: em 2010:  + 1.098 M€; em 2011 :  - 1.464 M€; em 2012 :  - 1.201 M€; em 2013: - 3.045 M€
Iniciei a apresentação destes números em 2010 para mostrar bem a influência da crise da dívida soberana.
A crise económica, de que resultou uma intensa subida do incumprimento no crédito e das imparidades (33 bi desde 2008), a redução da margem financeira e o custo do capital foram, naturalmente, os elementos responsáveis pelos maus resultados.
A recuperação da rentabilidade enfrenta um enquadramento complicado:
Na actuação sobre os proveitos, defrontamos o seguinte contexto:

  • o aumento do volume (de crédito, nomeadamente) está condicionado por uma procura ainda débil e insuficiente para as necessidades dos bancos (e a concorrência entre eles para “conquistarem” clientes limita a subida de spreads);
  • a margem financeira está sob fortíssima pressão, dadas as muito baixas taxas de juro da Euribor;
  • as comissões vêm sendo muito condicionadas por restricções regulatórias e por iniciativas legislativas;
  • os rendimentos de operações financeiras, dependendo muito da gestão e situação de cada instituição, não deverão apresentar melhorias muito significativas, em termos gerais,
  • a recuperação de crédito e o controlo das imparidades continuam a ser muito relevantes


 A margem de actuação no lado dos proveitos está, pois, bastante condicionada.
A redução de custos surge como factor determinante para a recuperação da rentabilidade.
E os bancos têm vindo a actuar neste domínio, tomando medidas de várias naturezas, que incluem redução de efectivos.
Mas, contrariando esta necessidade, surgiram, entretanto, novos e relevantes custos, associados à nova regulação e supervisão, que acrescem aos que derivam dos meios que se utilizam e dos investimentos que obrigam:

  • as supervisory fees relativas à SSM;
  • as contribuições para o Fundo Único de Resolução;
  • as contribuições para o Fundo de Resolução Nacional, para atender à resolução do BES.

Todo este difícil enquadramento poderá ser agravado se a taxa Euribor a 3 ou mais meses atingir valores negativos e se persistir assim durante algum tempo. É que a banca portuguesa, no contexto europeu, é uma das que mais utiliza taxa de juro variável. Este é um problema novo, com implicações no presente e impactos no futuro.

Entretanto, com as actuais rentabilidades, os bancos têm dificuldade em atrair investidores para o caso de necessitarem de reforçar o seu capital.
Neste momento, os rácios de capital são razoáveis e tem sido possível absorver as perdas.
Mas esta equação para o retorno da rentabilidade e atracção dos investidores é difícil e constitui, actualmente, o maior desafio para os nossos bancos.


Fernando Faria de Oliveira

Coimbra, 11 de Abril de 2015